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IVAN TEIXEIRA O particular e o universal

Épicos, milésimo título da Edusp, que inaugura a coleção “Multiclássicos”

Leia a seguir entrevista com o crítico e ensaísta Ivan Teixeira sobre Épicos, primeiro volume da coleção “Multiclássicos”. Mestre e doutor em literatura brasileira pela usp, professor de literatura brasileira da eca e da Universidade do Texas (Austin), Ivan Teixeira vem desenvolvendo pesquisas no estudo retórico e histórico da literatura, com ênfase no século XVIII. É autor de de Mecenato Pombalino e Poesia Neoclássica (Edusp/Fapesp, 1999), pelo qual recebeu o Lasa Book Prize (eua) e o Prêmio Jabuti, ambos em 2000.


Ivan Teixeira, organizador da série "Multiclásicos"






Caderno de Leitura: Qual a especificidade desses épicos brasileiros em relação à tradição do gênero nas literaturas ocidentais?

Ivan Teixeira: Como outros gêneros da tradição, o épico possui fórmulas fixas e recorrentes. Segue uma espécie de código transnacional, cujas características se consolidaram, principalmente, com os poemas homéricos e com a Eneida, de Virgílio. Depois da Idade Média, esse modelo é retomado pelos séculos XV e XVI, ressurgindo em Ariosto, Camões e Tasso. A tradição épica brasileira deriva diretamente desses três poetas, sobretudo de Camões. A singularidade dos textos editados em Épicos consiste na semantização regional daquela estrutura internacional. Esses poemas foram escritos com propósitos socioculturais específicos. Pretendiam responder a questões particulares da vida política de seu tempo. Isso dá um sentido extremamente vivo a tais textos. A dificuldade é que requerem certa paciência arqueológica, pois a graça deles decorre, em grande medida, da descoberta de suas relações com o debate cultural de que participam. Mas, sobretudo, deve-se destacar a singularidade que a língua da poesia assume em cada poema.

Caderno de Leitura: Existem casos semelhantes de um conjunto de épicos como este na literatura latino-americana?

Ivan Teixeira: Existem muitos. A experiência histórica atinge o nervo do discurso épico. Visto que esse tipo de narrativa integra os dispositivos básicos de organização cultural do Estado, a América hispânica também utilizou a epopéia como meio de integração do particular ao universal. Isto é, o conquistador ibérico inventa um padrão a partir do qual se caracterizam os povos dominados. Nesses casos, a América fala pelo código europeu. Destaco três exemplos, entre os quais se contam alguns poetas nascidos na Espanha, mas muito envolvidos com os assuntos americanos. A mais conhecida dessas epopéias é La Araucana, de Alonso de Ercilla.

Esse autor foi lido pelos épicos brasileiros, particularmente por Basílio da Gama. No mesmo ano da terceira parte de La Araucana, já no final do século XVI, Pedro de Oña publicou Arauco Domado, que é uma espécie de variação sobre o mesmo tema, isto é, sobre a relação dos conquistadores espanhóis com os índios de Arauco, no reino do Chile. No século XVII, a mais conhecida epopéia desse tipo talvez seja La Grandeza Mexicana, de Bernardo de Balbuena. Um colega aqui de Austin, James Nicolopulos, possui um excelente livro sobre as conexões de algumas epopéias latino-americanas com Os Lusíadas. Trata-se de The Poetics of Empire in the Indies, editado pela Pennsylvania State University Press, em 2000. Acho que merece tradução para o português.

Caderno de Leitura: Considera que esses livros são suficientemente valorizados, lidos e interpretados pelos leitores e estudiosos de literatura brasileira?

Ivan Teixeira: De modo geral, esses poemas foram subestimados pelos estudiosos. Algumas vezes, foram distorcidos para que se ajustassem a interesses de momento. Revisitar historicamente essa espécie de texto pode representar um gesto de ruptura com certo padrão de entendimento do passado e com a ocupação de alguns espaços de poder no presente.

Durante décadas, os estudos literários no Brasil foram dominados por alguns temas que se tornaram rotineiros. Em certo sentido, as supostas escolhas espelhavam, como espelham um pouco ainda hoje, uma visão monocêntrica da cultura e do ensino. A própria Universidade reagiu contra isso, produzindo apreciável renovação de métodos e de assuntos.

Caderno de Leitura: O volume tem o propósito de iluminar novos aspectos desse gênero no Brasil?

Ivan Teixeira: A coleção Multiclássicos não possui grandes pretensões. A proposta básica é ajudar a circulação de textos que nem sempre seduzem editoras privadas. Com isso, pode ser que decorra um estímulo ao debate em torno desse tipo de obra, promovendo sua inserção atualizada nos dias de hoje. No Brasil, há inúmeros livros sobre os quais se repetem noções envelhecidas, algumas com séculos de existência, as quais não serão abandonadas senão pela renovação de sua leitura. A introdução geral ao volume, sobre a história e a teoria do gênero épico, foi escrita por João Adolfo Hansen. Os estudos específicos sobre cada um dos poemas me parecem igualmente relevantes.

Caderno de Leitura: Existem outros poemas épicos brasileiros que tenham ficado de fora de sua seleção?

Ivan Teixeira: Restrinjo-me a um exemplo. Gostaria de ter incluído a Descrição da Ilha de Itaparica, de Frei Manuel de Santa Maria Itaparica, do século XVIII. Como Prosopopéia, esse poema participa da discursividade instaurada por Camões. Há traços de paródia, sobretudo nas insinuações eróticas, que remetem à “Ilha dos Amores”, de Os Lusíadas. Seu argumento é a pesca e o preparo artesanal da baleia. Tratase de uma espécie de pintura móvel. Inicia-se por pequenos peixes e crustáceos, até, gradativamente, chegar ao “Monstro do mar, Gigante do profundo”, que, depois de oferecer resistência aos pescadores, é conduzido aos pedaços a grandes caldeirões sobre chamas. Em seguida, a elocução abandona o estilo sublime e retoma a enumeração humilde de elementos pequenos e aprazíveis, como a banana, os limões, o ananás e os cajus. Nos momentos de tensão entre o homem e a besta, além de uma alusão bíblica, o texto remete a versos exclamativos do “Velho do Restelo”, também de Os Lusíadas.

Caderno de Leitura: Uma questão editorial: em sua experiência no meio universitário norte-americano, percebeu grandes diferenças entre a linha de publicações das editoras universitárias daí e de editoras brasileiras como Edusp, Unicamp, Unesp, UnB etc.? Estamos muito longe do padrão de qualidade dos EUA?

Ivan Teixeira: Pergunta difícil, pois cada qual atende a necessidades específicas e depende de diferentes condições. Este é o quarto semestre que leciono nos EUA. Trata-se, portanto, de uma experiência pequena. Mas, tanto quanto posso perceber, julgo que as editoras universitárias do Brasil possuem o mesmo nível de eficiência que as daqui. Chegaria a arriscar a hipótese de que as edições da Edusp, em particular, oferecem um delta a mais, pois seus livros são mais contagiantes, menos padronizados. Depois de João Alexandre Barbosa e de Plínio Martins, as edições da Edusp assumiram um compromisso de qualidade e invenção surpreendente em qualquer parte do mundo. Tanto quanto alcanço, diria que a Universidade de São Paulo estimulou as demais editoras públicas, auxiliandoas a adquirir um perfil moderno e eficiente.





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